quinta-feira, 6 de março de 2008

Negação da experiência pedagógica: o muito pelo pouco

Nesta sociedade, onde tudo é mercado, o conhecimento também vira mercadoria. Nem vou falar de escola particular, pois quem a paga sente muito bem o peso das mensalidades, o custo da mercadoria...
Quero falar, isso sim, dos cursos de extensão ou de aperfeiçoamento, oferecidos aos professores na forma de reciclagem ou treinamento. A transformação de muitos desses cursos em verdadeiros rituais totêmicos merece ser refletida.
As chamadas “inovações pedagógicas”, enlatadas e vendidas por gurus de fala grossa, circulam pelos desertos do magistério conforme as estações da moda: neste semestre, esta proposta; no semestre que vem, aquela abordagem. Nesse veste-desveste de propostas, teorias, abordagens, inovações etc. etc., os professores se sentem eternamente como seres desnudos e desnucados.
A imagem do manequim de vitrina cabe bem aqui. Oco. Sem rosto, Parado, Pé de ferro, Que é enfeitado, trocado, quando chegam as novas mercadorias. Que é retirado de cena, quando não cumpre a sua função de venda.
Outra imagem que também cabe é aquela do espantalho. Recheado de palha. Feição assustadora. Preso a um caibro para ser movimentado de quando em vez. Que é talhado com roupas velhas no sentido de afugentar os pássaros curiosos. Que fica sempre de braços abertos, receptivo, tal o Cristo Redentor.
- Esqueçam tudo que estão fazendo e o que já fizeram em classe – diz o arauto da inovação. Agora o novo jeito de ensinar é este e somente este.
E toda a história profissional, vivida pelo professor ao longo do tempo, segue bueiro abaixo. “Puxa, só estou fazendo burrada em sala de aula!” – pensa inocentemente consigo mesmo, não relativizando nada.
O eterno substituir na esfera do magistério mais parece um edifício sem base, flutuando ao sabor dos ventos soprados pelos gurus e passível de ruir com um leve toque dos dedos.
Quem, sem consciência, nega a sua experiência, nega a sua condição de sujeito. A menos que o professor, por ser masoquista, já tenha se acostumado ao papel de manequim ou espantalho – um direito que lhe cabe, sem dúvida alguma. Cabe para si, mas talvez não caiba aos seus alunos...


Referência
SILVA, Ezequiel Theodoro da. Magistério e mediocridade. 5. ed. São Paulo: Cortez, 2001.

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